Ela sempre foi muito disciplinada, estudiosa, caprichosa e responsável. Minha mãe não poderia ter menos orgulho de uma filha como ela, afinal espera-se da filha mais velha, em geral ou na teoria, que ela seja o exemplo para os mais novos. A Dri sempre foi.
Seus cadernos vinham decorados com sua letra grande, redonda e cheia de caprichos para ninguém botar defeito. Estudiosa como ela, eu não conheci ninguém. Nas vésperas das provas deixava todo mundo lá de casa louco. Acendíamos velas, rezávamos, pedíamos a calma para ela vencer o desespero e fazer a prova tranqüila, já que as apostilas ficavam manchadas pelas suas lágrimas. Quando ela chorava a gente tinha a impressão que ela faria a pior das provas e, consequentemente, teria um dos piores resultados. Mas no final tudo dava certo e ela sempre tirava notas máximas. Tínhamos vontade e esganá-la e não parabenizá-la. Era sempre assim. Prova era sinônimo de muito estudo, choro e velas. E notas altas.
Por ser a mais velha, a Guna sempre me ajudou em matérias que eu “perigava” e me ajudava nas lições de inglês, já que tinha anos de estudo na minha frente.
Foi ela quem me ensinou a ver as horas. Isso porque eu precisava falar as horas em inglês, mas para isso, era – obviamente – necessário saber responder a tão medonha pergunta: que horas são? Ela, então, pegou uma tampa de uma caixa de sapato, desenhou os números em um círculo e inseriu dois ponteiros móveis. Pacientemente me explicou que o menor apontava as horas e o menor os minutos. Foi bem difícil pra mim, porque eu ainda não havia tido aulas de tabuadas, portanto como saber o tal do 5,10, 15, 20…? Imagina a paciência que a criatura teve que ter comigo. Primeiro me ensinou a tabuada, depois as horas e depois como dizer isso tudo em inglês. Claro que eu queria morrer e achava que o mais fácil seria mesmo andar sem relógio.
Como qualquer dupla e irmãs que se prezem, brigávamos por motivos cretinos e banais. Não me lembro no momento de nenhum específico, mas tínhamos arranca-rabos bem dignos. Daqueles de gritar, de puxar cabelo, de fechar a cara, de jogar coisas uma da outra no chão etc, etc, etc, mas nada fora do comum. A única coisa que lembro na verdade era que eu me vingava, durante as brigas, dando muito soco no urso dela, o Blau Blau, aquela coisa fedida que ela tinha, hahaha.
A gente sempre dividiu o quarto e só deixamos de fazer isso quando ela saiu de casa. Óbvio que a minha bagunça a deixava louca e que eu queria matá-la quando ela ligava a luz na minha cara para escolher a roupa para trabalhar. Mas quando eu entrei na fase do medo, lá pelos meus 10/11 anos, era ela quem me acompanhava até o banheiro, ia comigo à cozinha buscar água e me deixava juntar as nossas camas para eu poder dormir grudada nela.
E apesar de ser esse poço de disciplina, quase militar, a Dri sempre foi muito, mas muito divertida. Inventava brincadeiras tão sem nexo que é impossível não registrar. Um exemplo: sanduíche de gente. A maluca inventou que eu, meu irmão e os meus primos Luiz Carlos e Ana Luiza deveríamos deitar em um colchonete para ela nos transformar em um saboroso lanche. A gente entrava na dela e obedecíamos. Deitávamos de bruços no meio do colchonete e ela dobrava a parte que sobrava sobre nós, que ficávamos apenas com os pés e as cabeças para fora. Como era o preparo do lanchinho? Ela pulava em cima da gente, óbvio! Era a maior festa, porque ela dizia, entre gargalhadas: essa salsicha aqui tá estranha e precisa ser triturada mais um pouquinho! Ela tinha umas ideias bem questionáveis como eu já disse aqui, mas isso não vem ao caso porque hoje é um dia bem especial.
Também foi ideia dela o diálogo do idioma que não existe. E pensa que éramos crianças? Nã na ni na nã. Tínhamos uns 20 e poucos anos e do nada ela perguntava: verishinakoviski? E eu respondia: sim, kansblesgastam. E ríamos até ficar com dor no estômago, chorar de rir e quase fazer xixi nas calças. É ainda muito comum falarmos assim, rá!
Ela sempre amou sorvete de flocos, bolo de nozes e das músicas do Lulu Santos. Lembro que ela montou uma pasta de dar inveja a qualquer um com todas as matérias, notas e fotos publicadas sobre o último romântico.
Foi sempre delicada, chorona e…fresca. Nossa, ela nunca tirava o lixo e jamais ia à padaria comprar pão e eite. Guna chata! E sempre foi nóia. Ela demorava horas para se arrumar e perguntava horas se estava bom, se o cabelo estava legal, se o sapato combinava, se isso, se aquilo.
Chata, nóia, fresquinha, patricinha e perfeitinha, a Guna é a melhor irmã do mundo. Amorosa, carinhosa, engraçada, divertida e generosa. Foi ela quem pagou a mensalidade do meu 3 colegial inteirinho só para eu concluir os estudos em um bom colégio e ao lado das minhas amigas. Foi com ela que eu me esbaldei na Disney…Ela foi uma das que não arredou o pé quando eu operei e precisei de ajuda no hospital, no banho, no cuidado com o curativo. Sempre muito maezona, cuidou de mim como tal.
E como tal, ela é a mãe mais engraçada que tem nessa vida. Ela imita o barulho de um liquidificador de uma forma tão engraçada que eu me pego pensando: cara, da onde é que isso aí saiu? Essa pessoa é uma executiva super respeitada de uma das multinacionais mais importantes do país. Sim, eu juro por Deus que essa executiva aí brinca com suas filhas fazendo uns grunhidos super esquisitos(!).
É essa maluca aí que também me escreve cartinhas, cartões e e-mails iniciando a mensagem exatamente assim: querida Hermãn…
Ah e ela é cheia das surpresas. Duas semanas antes de eu me casar, o Frango me ligou insistindo muito para eu passar em nosso apartamento. Muito contrariada fui até lá, no meio da semana. O motivo? Coisas que só uma Guna faz por você. Ao abrir a porta daquele apartamento vazio e tomado pelo eco, me deparei com compras de supermercado feitas por ela. Era produto que não acabava mais no meio da sala. A geladeira? Cheia de guloseimas deliciosas, como o danete edição limitada sabor Sensação, o meu preferido. Tinha suco, manteiga, requeijão, ovos… Eu simplesmente não acreditava naquilo. Chorei litros abraçada ao confort, ao papel higiênico, aos produtos de limpeza, aos deliciosos biscoitos, ao macarrão, ao molho…
A Guna é assim. Não há adjetivos, só sei que Deus foi bom em colocar em meu caminho uma hermãn como ela.
Guna-lagartixa-branca, te amo mais que tudo e você sabe disso. Obrigada pelas horas dedicadas a mim, pelas horas ensinadas e por todas as horas presente ao meu lado e no meu coração.
Feliz aniversário, minha linda.
Bjs.,
Pê
Guna lagartixa branca ao lado de suas melhores criações